Um dos grandes objectivos de ir até à Noruega era fazer 3 das mais famosas trilhas do país mas quis o destino (nome querido para mau tempo) que os planos tivessem de ser alterados. Inicialmente o plano era fazer a trilha até Preikestolen (7km total) e no dia seguinte para Kjerag (11km total), ia ser assim de rajada porque o seu nível de dificuldade não é muito. A chuva e a tempestade não estavam a nosso favor e a coisa não se deu, podem ver a alternativa no artigo sobre toda a viagem na Noruega.
Já em relação à terceira e última trilha, Trolltunga, fomos e quase falecemos pelo meio mas terminámos com sucesso. Não sei como posso dizer isto de forma a não desmotivar ninguém a embarcar numa aventura por esta trilha, não é fácil e não se faz com uma perninha às costas, acreditem. Mas vale a pena, vale a vista durante todo o caminho e claro, a paisagem do destino. E hoje acredito que o mau tempo que nos impossibilitou de fazer as outras duas trilhas foi uma benção, sei que não teria conseguido fazer todas as trilhas no espaço de apenas 3 dias. Mais um ditado para a mesa, “há males que vêm por bem”, cai que nem uma luva.
Comecemos pelo o dia em que descobri esta trilha e em a que coloquei na lista de locais a visitar, o destino pareceu-me espetacular e se há coisa que gosto é de desafios. Pesquisei imagens, artigos e todas as informações sobre como ir, onde dormir, o que vestir e como sobreviver durante aqueles km todos no meio das montanhas na Noruega. É verdade, li muito sobre a trilha mas nada nos prepara para aquilo (a não ser uma forma física impecável, luxo que não disponho agora), e apesar de estar mais ou menos informada sobre tudo, houve uma coisa que me escapou, o número certo de km no total. Não sei explicar mas fui convencida que no total eram uns 20 km, uns 10 na ida e outros 10 na volta, não era fácil mas o entusiasmo iriam ajudar a terminar tudo sem problemas.
Mas, este mas é importante para todos os que querem ir bem informados, não são 20km, não são 25km, são 28km no total. 28km de trilha, não esqueçam este número. E a brincadeira não é terreno plano, claro, pelo caminho que fomos (depois descobrimos outro, já lá irei) são pelo menos 4km iniciais sempre a subir numa estrada alcatroada que é em formato de serpente. Podem imaginar na subida atrás de subida que têm pela frente, uma hora pelo menos. Nesta altura ainda achávamos que eram 10km, ingénuas, e ainda apanhámos alguma chuva.
Depois da estrada de alcatrão estávamos cansadas mas entusiasmadas por finalmente entrar na trilha pelas montanhas. A primeira parte é bastante plana, passámos por alguns riachos e o piso é rochoso (aqui já começam aparecer placas a informar dos km que faltam, não sei se é bom ou se é um completo motivo para chorar). Após uns 2km de terreno plano a dificuldade começa aumentar, temos então uma zona a subir, rochosa e bem a pique. Preparem-se, custa tanto a subir como a depois a descer.
Nesta altura são mais uns 4 km sempre a subir, o terreno vai variando entre rochas pequenas e rochas planas e gigantes (com alguma água a passar, cuidado por ser muito escorregadio). Durante todo este caminho as placas com os km que ainda faltam estão sempre a lembrar-nos que o destino está cada vez mais próximo mas ainda assim a um dedo do inferno. A paisagem ao longo do caminho é linda, mesmo. Há de tudo (pelo menos em Junho, altura que fomos), chuva, sol, rochas, riachos, lagos, neve, pedras, lama e algum vento.
Fizemos bastantes pausas, o que ocupou algum do nossos tempo de trilha, para descansar ou para comer. É muito importante levar bastante (qb) comida e água, sendo que em relação à água o mais aconselhável é apenas uma garrafa e depois encher nos riachos e lagos (a água é potável, é da fonte).
Depois de 14km e de 5 horas de trilha, chegámos. Durante todo o tempo passaram por nós dezenas de pessoas (muitas delas com coisas para acampar pelo caminho ou no destino) que estavam agora a regressar ou ainda a apreciar a beleza da Trolltunga. Quando chegámos, mortinhas de cansaço, decidimos sentar e comer qualquer coisa mas não foi a decisão mais acertada, e eu explico a razão. A fila para tirar uma foto na ponta da Trolltunga é de loucos, todos querem, claro, tirar uma foto a comprovar que estiveram lá. Na altura que chegámos havia uns 20 minutos de espera mas quando decidimos ir para a fila, já almoçadas, a fila estava muito maior e tivemos de esperar uma hora, UMA hora pela nossa vez. Hora de ponta, obviamente.
Como éramos só duas tivemos que arranjar uma forma de conseguir tirar as fotografias quase na mesma altura, não tínhamos mais tempo nem paciência para voltar ao fim da fila para a outra tirar fotos. Tivemos as duas na fila até ao local em que é preciso descer um pequena rocha e depois disso eu fui para o posto de fotografa. Tirei as fotos e com jeitinho passei à frente na vila pedindo permissão e explicando que tinha estado na fila mas que eu e a minha amiga estávamos sozinhas e só assim conseguíamos fotografias. Foi tranquilo, lá fui passando e esperei uns 5 minutos pela minha vez. Depois disto é mudar de posição umas 3 vezes, é sorrir, acenar e tentar não cair da pedra. De longe parece bastante perigoso mas lá em cima não se tem percepção da altura, pessoas com medo de alturas, nada temam.
Com as fotografias tiradas e o corpo reabastecido foi tempo de dar cor aos sapatos e voltar para trás. Esperavam-nos mais 14km e mais umas 5 horas. Sim, demorámos o máximo de tempo possível na trilha. Precisamos de um desconto, somos novatas nisto das trilhas e parámos bastantes vezes. A volta foi mais um refresco para os olhos e uma tortura para as pernas, pelo meio ainda consegui cair numa pedra que tinha um pequeno riacho a passar, claro que escorreguei e encharquei toda a roupinha. Nada de preocupante, por esta altura estava bastante calor e mais uns 3km de trilha chegaram para secar.
Ainda faltavam uns 6km e eu já perdia as forças, já pensava que raio de ideia tinha sido aquela de me armar em campeã das trilhas. A minha amiga já me tinha morto mentalmente mais de dez vezes, rogou-me pragas, acredito, para os próximos 10 anos. O que nos saia automaticamente era “nunca mais” e nada mais. Por esta altura já a conversa era mínima, não sei qual era a vontade mais forte, a de chorar ou a de chegar ao fim. Esta trilha é um jogo de sentimentos, eu só me lembrava da frase “quando o homem pensa que não pode mais, ainda pode outro tanto”. E a verdade é que o psicológico é amigo e porto-seguro em situações em que o corpo está prestes a desistir.
Os últimos 4 km, a serpente de alcatrão, foi muito dificil pela inclinação e por parecer não ter fim. Chegámos às 19h30, o último autocarro era às 20h. Chegámos vivas e mortas ao mesmo tempo, eu só consegui sorrir por ter acabado este desafio e pensar que num futuro próximo não me apanhavam mais a bater pé em trilhas (coisa que não aconteceu).
Se depois de todo esta descrição ainda quiserem lançar-s à Trolltunga, são os maiores. Eu aconselho, juro! E foi aqui que pelo meio me lembrava do ditado “não importa o destino, mas sim a viagem”, as paisagens são de loucos e só se vive uma vez. Vão, por favor vão!
ps: passados uns dias descobrimos que existe outro caminho para os primeiro 4km (serpente), fica mais do lado esquerdo. perguntem ao pessoal que trabalha perto do ponto de partida. Este caminho não está assinalado no mapa e ninguém sabe a razão, se quiserem poupar esforço fisico procurem por ele porque continua em funcionamento (foi um guia, o nosso host em Bergen, que nos disse depois).
Pontos importantes:
Onde dormir? Pequena vila, Odda (eu fiquei aqui)
Ou mesmo acampar perto da Trolltunga, é possível.
Como chegar ao início da trilha? Carro – parque de estacionamento 50 euros (15 minutos desde Odda)
Autocarro Shuttle (foi o que usámos e fica a 25 minutos de Odda) – 25 euros (ida e volta por pessoa). Tem vários horários, imagem abaixo com paragens e horários. Nós apanhámos mesmo junto ao hostel e comprámos o bilhete directamente no motorista.
Nos fomos no autocarro das 6h da manhã e voltamos no das 20h.
O que levar na mochila?
Garrafa de água (é possível encher de novo nos riachos pelo caminho), comida, muda de roupa para trocar na volta (depois de suar é importante colocar uma muda lavada por causa do vento), câmera fotográfica (opcional, a maior parte das minhas fotos foram tiradas com o meu telemóvel Huawei P9 lite), protector solar e óculos de sol.
Que roupa levar?
Bons sapatos são o mais importante, na minha opinião. Isto porque eu não os tinha e penso que possa ter sido mais desafiante por isso. O caminho é muito rochoso e umas boas botas fazem a diferença.
Para Junho, que é o que eu sei: t-shirt, camisola de mangas compridas mas leve, um casaco mais leve e um casaco mais grosso e protector contra vento e chuva. Dois pares de meia (uns para a muda), gola, gorro ou tapa orelhas (é bom por causa do vento). Umas calças desportivas ou qualquer coisas em que se sintam confortáveis e livre para movimentos.
Que comida levar?
Snacks, snack e snacks. Levei ovos cozidos, fruta, bolachas, barritas, uma sandes de omelete e duas sandes com hamburguer. A comida nunca é demais, eu precisava de energia.
Quando ir?
Não está todo o ano aberta devido à neve e mau tempo. É possível ir em Março com um guia e com snowshoes mas tirando isso é proibido ir no inverno. Melhor altura é entre Junho e Setembro. Eu fui a meio de Junho e ainda apanhei neve, alguma chuva e um sol bem quente.
Importante: podem consultar toda a informação sobre esta trilha no site visitnorway.com, está lá tudo.
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